No dia 11 de março de 2018, a Colômbia realizou as primeiras eleições legislativas com a participação de candidatos da Força Alternativa Revolucionária do Comum, partido criado após a conclusão do acordo de paz para o conflito que evolveu por cinco décadas as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – Exército do Povo (FARC-EP). A Força Alternativa recebeu menos de 100 mil votos na estreia eleitoral. No entanto, o acordo de paz garantiu a seleção de 10 membros do partido para os exercícios legislativos entre 2018 e 2026 como alternativa para permitir a representação política do grupo e iniciativa para impulsionar a reconciliação nacional, apesar dos resultados das urnas. É prudente destacar que outros grupos minoritários possuem a garantia de assentos nas casas legislativas colombianas, sob o exemplo significativo das representações de lideranças indígenas. Outra consideração relevante à análise consiste na não-obrigatoriedade do voto no país latino-americano.
Em contrapartida, a informalmente denominada “Coalizão do Não”, composta por partidos de direita e que conta com a figura do ex-presidente colombiano, Álvaro Uribe, conquistou 50 das 108 cadeiras do Senado, e 83 dos 171 assentos da Câmara de Representantes. O grupo reúne representantes contrários ao acordo de paz como o senador pelo partido Centro Democrático e candidato à presidência da República da Colômbia, Iván Duque. O presidenciável posicionou-se favoravelmente à realização de modificações significativas nos acordos negociados com as FARC-EP.
É preciso notar que o plebiscito que buscou mensurar a aprovação dos cidadãos colombianos aos resultados do processo de paz, realizado em 2 de outubro de 2016, foi marcado por intensa polarização. O resultado da apuração indicou que 50,2% dos votantes se opôs à conclusão do acordo com as FARC-EP. O ex-presidente Uribe foi porta-voz de uma intensa campanha contrária à decisão pela paz. Nota-se, em agravo, que a abstenção ao pleito alcançou o marcador de 60% da população registrada para votação.
O processo de paz na Colômbia compreende etapas de desarmamento, desmobilização e reintegração dos antigos combatentes do antigo grupo guerrilheiro. A etapa de deposição das armas das FARC-EP e o cessar-fogo bilateral foram monitorados por atores internacionais. A Organização das Nações Unidas, sob pedido das partes beligerantes, autorizou o envio de uma missão de verificação para a primeira etapa de cessão das hostilidades. As iniciativas de reintegração dos ex-combatentes também são supervisionadas por uma missão internacional.
É possível considerar que o termo “reintegração” remete frequentemente à ideia de que o combatente não participa do cotidiano social do país. No entanto, percebemos que, ao longo dos 52 anos de conflito, a ação dos guerrilheiros e das forças de segurança colombianas enraizaram-se no dia-a-dia colombiano. A associação de grupos guerrilheiros colombianos à produção e tráfico de entorpecentes, assim como a realização de sequestros, tornou-se uma fonte de financiamento de suas atividades. É adequado considerar que, sob o símbolo revolucionário, as FARC-EP buscaram se opor à institucionalidade do Estado colombiano. Observamos também ações deliberadas de governos e agências do Estado colombiano com o objetivo de marginalizar o movimento guerrilheiro, sobretudo ao imputar associações imediatas entre os grupos irregulares e a criminalidade. Dessa maneira, é prudente considerar que as ações de reintegração dos ex-combatentes referem-se ao objetivo de permitir sua participação política através da institucionalidade estatal.
Os registros de violência, para além de implicações relativas ao combate entre o aparelho de segurança estatal e as forças guerrilheiras, geraram traumasna população civil. Nesse sentido, enfatiza-se a relevância de promover iniciativas para a reconciliação nacional. Argumentamos que, sob o afã de concluir os acordos de paz, iniciativas de justiça de transição foram submetidas ao objetivo de participação política pelo antigo grupo guerrilheiro. Reiteramos, assim, a necessidade de considerar a participação dos atores locais no processo de construção da paz. A consolidação de uma conjuntura pacífica demanda a compreensão das posições refratárias à conclusão dos acordos com o grupo guerrilheiro.
Em quadro geral, a perspectiva pela consolidação da paz depara-se com uma série de obstáculos significativos, visto a resistência de partes significativas da liderança política à participação dos antigos combatentes na sociedade civil colombiana. Ao observar o esforço pela paz na sociedade colombiana, é preciso destacar as negociações em torno do conflito entre o governo colombiano e o Exército de Libertação Nacional. O cessar-fogo temporário, apesar de violações por ambas as partes, pode ser interpretado como um avanço em análises otimistas. Indicamos, no entanto, que o crescimento de quadros políticos contrários aos acordos de paz nas eleições 2018 representam uma resistência grave à consolidação de uma conjuntura pacífica no país. Ademais, é preciso considerar a manifestação popular no plebiscito realizado no ano de 2016 de maneira a implementar ações de promoção da paz. Corroboramos, nesse sentido, o argumento de que a consolidação da paz demanda uma análise extensiva dos efeitos da violência ao longo das cinco décadas de conflito.
Compreendemos que a possibilidade de representação política dos interesses do antigo grupo guerrilheiro constitui um marco significativo para a construção de uma sociedade pacífica. No entanto, assinalamos que a condução das iniciativas para a construção da paz demanda um espectro temporal próprio, avaliado de acordo com os obstáculos impostos. Assim, reitera-se a necessidade de promover uma iniciativa ampla de reconciliação nacional, capaz de mobilizar os atores locais para a resolução de problemas que afetam a sociedade colombiana.
Leonardo Dias de Paula é mestrando em Relações Internacionais pelo PPGRI San Tiago Dantas e pesquisador do Gedes.
Imagem: Elecciones 2018. Por CNE. Por: Consejo Nacional Electoral.