Os ataques israelenses à Síria: Putin estaria sabendo?

Durante os seis anos que já duram a guerra civil síria, dezenas de ataques aéreos contra alvos do Hezbollah foram atribuídos a Israel. Até agora, o governo israelense se recusou a reconhecê-los ou negá-los. Entretanto, os ataques realizados em 17/03 foram confirmados por Israel. Tanto o Primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, como o Ministro da Defesa, Avigdor Lieberman, declararam publicamente que Israel atacou a Síria para defender seus interesses estratégicos, ou seja, impedir que o Hezbollah obtenha mais armamento para seu arsenal no Líbano.
Os referidos ataques foram os primeiros a serem confirmados oficialmente pelo porta-voz das Forças de Defesa de Israel (IDF). Embora não se tenha esclarecido quais eram os alvos, um comboio do Hezbollah, uma fábrica e um armazém de armas foram atingidos e um comandante do Hezbollah foi morto no ataque aéreo, segundo relatórios da mídia árabe alegaram.
Uma série de questões surge a partir da pouca informação que foi publicada. Primeiro, por que Israel mudou sua política e de repente reconheceu um ataque? Uma possível resposta pode estar associada à necessidade de uma explicação oficial após um grande estrondo ouvido em cidades em Israel e na Jordânia, devido à interceptação de um míssil sírio. As forças de defesa aérea da Síria lançaram um míssil de longo alcance na tentativa de derrubar os caças de Israel. O míssil foi lançado muito tarde para pôr em perigo os aviões, mas poderia ter caído em áreas civis dentro de Israel e, portanto, foi interceptado por outro míssil. A forte explosão foi ouvida em Jerusalém e partes dos mísseis caíram na Jordânia, significando que alguma explicação tinha que ser dada. Contudo, uma declaração sobre a interceptação de um míssil teria sido suficiente. A decisão de assumir a responsabilidade pelos ataques também foi feita pelo Primeiro-ministro e pode ter sido decorrente de outras razões.
Exatamente uma semana antes dos ataques, Netanyahu estava em Moscoudiscutindo a guerra da Síria com o presidente russo Vladimir Putin. Poucos detalhes foram divulgados sobre o que foi dito na reunião, mas Netanyahu afirma ter deixado claro que Israel não concordaria com a presença militar iraniana na Síria, uma vez que o grupo Hezbollah é diretamente financiado pelo Irã para atuar na Síria e no Líbano. A preocupação do primeiro ministro israelense relaciona-se com declarações recentes do governo iraniano sobre a intenção de intervir diretamente com as forçar armadas na guerra da Síria.
Se essa demanda será ou não atendida por Putin ainda não sabemos, mas Netanyahu retornou a Jerusalém com a impressão de que o presidente russo leva as preocupações de Israel a sério, de acordo com suas próprias palavras. Um ataque realizado por aviões de guerra israelenses sobrevoando a Síria pode ser uma indicação de que há um entendimento com a Rússia sobre operações israelenses dentro da área protegida pela Rússia.
Os ataques de sexta-feira assemelham-se muito ao padrão dos ataques de dezembro de 2015, em um subúrbio de Damasco, no qual nove operários trabalhando para o Irã foram mortos, incluindo Samir Kuntar, o assassino de uma família israelense libertado por Israel em uma troca de prisioneiros em 2008. Este ataque ocorreu apenas três dias depois que Netanyahu e Putin se falaram por telefone, e foi o primeiro a ser realizado depois que a Rússia colocou um escudo de defesa aérea em grandes áreas da Síria, incluindo sua capital.
Era improvável que, em dezembro de 2015 e na sexta-feira (17/03/2017), Israel tivesse atacado a Síria, dentro da zona de operações da Rússia, se achasse que o Kremlin reagiria contrariamente. O fato de que foi o exército sírio que lançou um míssil contra os aviões de combate de Israel, enquanto existem sistemas de defesa russos muito mais avançados implantados nas proximidades, para proteger o regime sírio, também pode indicar que Assad e seus protetores russos não estão coordenados. Assad está ciente de que Putin tem discutido o futuro de seu país com outros líderes mundiais, incluindo Netanyahu. Sua tentativa tardia de derrubar aviões israelenses poderia ser um sinal de frustração em sua impotência de controlar seu destino e o espaço aéreo sírio.
Karina Stange Calandrin é doutoranda em Relações Internacionais pelo Programa de Pós-Graduação San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP, PUC-SP) e pesquisadora do GEDES.
Imagem: Meeting with Prime Minister of Israel Benjamin Netanyahu, March 2017 . By: Kremlim, Moscow.

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